“Ensine a criança no caminho em que deve andar,
e ainda quando for velho não se desviará dele” Provérbios 22.6.

Todos os cristãos, especialmente os que têm filhos, devem conhecer esse texto. Existe um princípio importante nele: nossos filhos levarão para toda a vida o que ensinamos. A Psicologia afirma que as crianças aprendem principalmente pela observação. Portanto, elas aprendem muito mais com o que vêm do que com o que ouvem. Por isso, como pais, nosso EXEMPLO é muito mais importante do que nossas PALAVRAS.

Penso que é por isso que a Bíblia recomenda ensinar a criança NO CAMINHO, e não O CAMINHO. Não adianta apontar a direção certa se eu não caminhar com ela pelo caminho. Isso vale para hábitos morais (como mentir), para hábitos alimentares e também para os hábitos digitais.

Pesquisas demonstram que quando os pais usam eletrônicos em excesso, os filhos seguem o mesmo padrão. A Organização Mundial da Saúde recomenda que crianças menores de 2 anos não utilizem telas em momento algum do dia, enquanto as de 2 a 5 anos não excedam uma hora por dia. Essas recomendações existem porque o uso excessivo de telas pode trazer diversos prejuízos. Crianças que passam muito tempo em frente às telas interagem menos com outras pessoas, o que pode resultar em atrasos no desenvolvimento da linguagem e de habilidades sociais. Além disso, o sedentarismo associado ao uso de telas pode contribuir para a obesidade infantil, diabetes e outros problemas de saúde. O uso excessivo de telas também está relacionado a problemas emocionais como ansiedade, depressão, irritabilidade e agressividade.

Como psicólogo, atendo pais preocupados com o comportamento de seus filhos, dizendo: “meu filho tem TDAH”, “meu filho deve ser autista”, “a escola diz que meu filho tem algum transtorno”. Porém, o que nós, psicólogos das relações familiares temos visto, é que muitos problemas comportamentais das crianças são resultado de um ambiente familiar desestruturado, de casamentos em crise, de pais que estão imersos em tecnologias e abandonam emocionalmente seus filhos, e de crianças que estão sendo bombardeadas com milhares de estímulos digitais, gerando prejuízos. Quando essas famílias mudam alguns hábitos, os problemas dos filhos diminuem drasticamente ou simplesmente somem! Isso nos faz questionar se essas crianças realmente têm transtornos, ou se as famílias é que precisam de mudanças.

Logo depois de desobedecer a Deus, Adão e Eva terceirizaram a responsabilidade pelos seus atos, culpando um ao outro. Adão disse: “Foi a mulher que o Senhor me deu”, culpando Eva e até mesmo a Deus pelo seu erro. Eva disse: “Foi a serpente que me enganou”. Ninguém assumiu a responsabilidade. Hoje estamos fazendo a mesma coisa: não assumimos que as dificuldades comportamentais dos nossos filhos podem estar ligadas ao nosso ambiente familiar desorganizado, disfuncional. Terceirizamos a responsabilidade para transtornos mentais. É claro que transtornos mentais existem, que é importante fazer um diagnóstico e tratar de maneira adequada. Porém, muitos dos meus colegas e eu estamos recebendo famílias que claramente precisam de mudanças em seus hábitos, mas culpam os transtornos pelo comportamento dos seus filhos.

Além dos efeitos negativos já mencionados, é importante considerar os riscos morais e espirituais dos conteúdos que nossas crianças consomem. As mensagens e os valores transmitidos nesses vídeos muitas vezes conflitam com os princípios cristãos que buscamos ensinar. A exposição constante a temas violentos, materialistas e sexuais, por exemplo, podem ameaçar alguns valores fundamentais que ensinamos. Como pais cristãos, devemos estar atentos que o conteúdo assistido pelos filhos esteja alinhado com nossos valores. Deuteronômio 6:6-7 diz: “Estas palavras que hoje te ordeno estarão no teu coração; tu as inculcarás a teus filhos, e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te e ao levantar-te.” Esse versículo reforça a importância de ensinar nossos filhos continuamente sobre os valores e princípios corretos. Entretanto, por vezes nossos filhos estão recebendo mais influência dos “influenciadores” digitais do que dos pais. Muitos pais cristãos estão negligentes, permitindo que influencers e outras pessoas ensinem aos filhos princípios e valores contrários à fé cristã.

Minha pesquisa mais recente demonstrou que o tempo que os pais passam no celular aumenta a probabilidade dos filhos terem dificuldades com raiva, tristeza e até ansiedade. Isso porque durante o uso, os pais estão desatentos e insensíveis às necessidades dos filhos, deixando-os “abandonados” emocionalmente.

Preste atenção nos seguintes sinais dos seus filhos:

  • Eles perderam o interesse por outras atividades?
  • Você tem dificuldade em fazer com que parem as atividades nas telas?
  • O uso de telas está fazendo com que passem menos tempo com a família, com amigos ou brincando?
  • Seu filho fica com raiva quando não pode usar telas quando quer?
  • O uso de telas é a única coisa que anima seu filho quando ele está triste?

Se você percebe alguns desses sinais, saiba que isso pode estar ligado ao seu próprio comportamento digital. Pense que você é o maior responsável por criar os hábitos dos seus filhos. Uma pesquisa perguntou a crianças e adolescentes quais regras os pais deveriam seguir quanto ao uso de celular. Veja as respostas delas:

  • “Largue o telefone quando seu filho está tentando dizer algo importante.”
  • “Não poste nada sobre mim sem me pedir antes.”
  • “Não passe todo o seu tempo livre nisso.”
  • “Pratique o que prega.”

Esse último item é particularmente assustador. Os filhos sabem quando os pais pregam coisas que não praticam. E mais importante: eles vão copiar os seus hábitos, mesmo que você não queira. Sabendo disso, é crucial que nós pais reflitamos sobre nossos próprios hábitos digitais. Estamos presentes de corpo e alma quando estamos com nossos filhos, ou estamos distraídos com mensagens e redes sociais? A vida dos nossos filhos está sendo moldada por nós todos os dias. Isso é uma grande responsabilidade, que não pode ser terceirizada.

A boa notícia é que podemos mudar e criar bons hábitos. Aqui estão algumas dicas para estabelecer um uso saudável da tecnologia no ambiente familiar:

  1. Estabeleça horários específicos para o uso de eletrônicos e respeite esses limites. Por exemplo, crie regras para que durante as refeições, todos deixem os celulares de lado e aproveitem o momento em família.
  2. Se você quer que seu filho passe menos tempo na frente de telas, comece diminuindo o seu próprio tempo de uso. Mostre que há muitas outras atividades interessantes, como ler livros, brincar ao ar livre ou jogar jogos de tabuleiro.
  3. Interesse-se pelo que seus filhos estão assistindo ou jogando. Essa interação permite que você monitore o conteúdo, enquanto abre oportunidades para discussões sobre o que é apropriado e saudável.
  4. Incentive brincadeiras, esportes, leitura e outras atividades que não envolvam o uso de eletrônicos. Isso ajuda a reduzir a dependência da tecnologia.
  5. Ensine seus filhos sobre as vantagens e os perigos do uso da tecnologia, conversando com eles sobre o assunto

Lembre-se: você é responsável por investir no desenvolvimento físico, psicológico e espiritual dos seus filhos. Efésios 6:4 diz: “E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e admoestação do Senhor”. Precisamos criar nossos filhos na disciplina do Senhor, andando com eles NO caminho da verdadeira vida cristã. Para isso, nosso exemplo é fundamental.

A tecnologia, quando usada de forma equilibrada, pode ser uma ferramenta incrível para diversão e aprendizado, inclusive de coisas espirituais. No entanto, é essencial estarmos vigilantes e conscientes de como ela impacta nossos filhos. Queridos pais, prestem atenção aos hábitos digitais de seus filhos, mas aos seus também. Estejam presentes fisicamente, emocionalmente e espiritualmente na vida deles. Afinal, alguns dos maiores presentes que podemos dar aos nossos filhos são nossa presença, nosso amor, nossa fé e o nosso exemplo.

Fabricio de Andrade Rocha

Pastor, psicólogo, doutor em Psicologia pela UFRGS e pesquisador na Université de Sherbrooke, em Quebec, Canadá.

Pesquisa o uso de tecnologias no ambiente familiar e os impactos no desenvolvimento infantil.